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Rochas Escuras

Notas do Repórter

Falar sobre o caso do desaparecimento de Laura Vitória é também se aproximar da realidade de outros milhares de casos de crianças que são sequestradas e retiradas de seus lares à força todos quase que diariamente no Brasil.


Diferente dos casos de desaparecimentos de adultos, onde parte deles ocorrem por motivos voluntários, o sumiço de uma criança é bem mais complexo, profundo e cruel, e na maioria das vezes atrelados àquilo que mais tememos: exploração sexual e adoção ilegal.


A vulnerabilidade é um dos fatores principais neste universo: bastam poucos minutos para que o rapto de uma criança seja realizado. Foi assim com Laura Vitória. Foi assim com Saphira Ferreira Lima. Foi assim com Carla Caroline. Foi assim com Sérgio Leonardo. Frações de tempo e que ainda custam muito às famílias.


Todos os casos acima ocorreram aqui no estado do Tocantins e seguem sem solução até os dias de hoje. O mais recente, o de Saphira, ocorreu em 2020. O mais antigo, de Sérgio Leonardo, falta pouco para completar 40 anos.


E aqueles outros que não chegaram a ser noticiados ou que não receberam a mesma repercussão?


Notadamente, o trauma em que todas essas famílias vivem é algo infinito. O título “Laura – Um Dia Sem Fim” remete justamente ao dia que nunca irá terminar, enquanto as famílias não conseguirem uma resposta sobre o paradeiro de seus entes queridos. Este dia é revivido, em detalhes, constantemente e a todo momento por eles.


A senhora Gilsandra Pereira, avó de Laura Vitória, até os dias de hoje celebra os aniversários da menina. A avó-mãe, como eu chamo, até hoje compra roupas para a menina. A dor é algo insuperável. A sociedade esquece, a polícia esquece, a Justiça esquece, mas a família não consegue.


Foram várias as vezes ao longo dos últimos setes anos que eu ouvi Gilsandra lamentar-se por ter pedido para a neta ir até ao mercado naquela manhã de sábado.


Mas, não podemos chamar esses casos de desaparecimento de acidentes, nem mesmo de incidentes e muito menos de tragédias. Todos estes termos remetem a algo que nos escapa do controle, algo ligado aos acasos crueis da vida.


Reflexões sobre a investigação


Não há como começar essa reflexão sem deixar claro o principal fator que fez com que Laura ainda não fosse encontrada: sua posição social dentro do sistema que vivemos. A menina pobre, preta e moradora da periferia de Palmas jamais iria merecer o tratamento digno por parte das autoridades.


Nada justifica a falta de apoio das forças de segurança públicas nas buscas realizadas nos primeiros dias do desaparecimento. No sábado, 09, alguns militares ajudaram nas buscas coletivas. No dia seguinte, nada. Ninguém, a não ser vizinhos e conhecidos, ajudaram a procurar Laura.


Isso é surreal e muito triste de constatar.


Nada justifica a polícia civil sequer ter ido ao mercado onde Laura fora vista momentos antes de desaparecer. As imagens da câmera de segurança feitas antes do seu rapto só vieram à tona cinco dias depois e foram entregues à polícia graças ao dono do estabelecimento, que decidiu – mais uma vez - procurar pelos registros da menina.


Nada justifica a figura de Ronaldo Santana, que possui histórico de abuso sexual contra crianças, só ter aparecido no radar da investigação mais de duas semanas depois do desaparecimento. Ronaldo morava no mesmo conjunto de prédios de Laura e a polícia só ficou sabendo da existência dele depois que um vizinho informou. Faltou diligência, faltou agentes em campo.

E sobre Ronaldo, um adendo: acredito que ele seja inocente quanto ao caso de Laura. Apesar do seu histórico, a polícia não comprovou sua participação. Não havia nada que o conectasse a Laura naquele dia, a não ser a pressa policial em resolver de uma vez o caso.


Ronaldo foi exposto, teve sua foto divulgada em inúmeros veículos de comunicação e enquanto esteve preso temporariamente, foi espancado e torturado por outros detentos.


Retornando ao trabalho policial neste caso, existem tantas outras pontas soltas que se tornaram impossíveis de serem apuradas com o passar do tempo, algo tão caro e fundamental na investigação de crianças desaparecidas. As primeiras 72 horas são cruciais, de acordo com pesquisadores do universo da criminologia.


E durante essa janela de tempo de três dias, a polícia havia feito somente uma coisa: coletar o depoimento da mãe de Laura, Sione Pereira. Somente cinco dias depois de Laura ter sido raptada, é que depoimentos e diligências importantes começaram a ser realizados, ou seja, quando a Divisão de Homicídios entrou no caso.


Outros possíveis suspeitos também foram deixados de lado. Alguns dos vizinhos de Laura, por exemplo, passaram despercebidos no caso. Um deles, inclusive, possuía as mesmas características físicas e veículo de locomoção que foram descritos lá na frente por uma testemunha que viu Laura no dia do seu desaparecimento conversando com um homem.


Esse vizinho chegou a ser ouvido uma única vez, no início do caso, mas nunca mais retornou ao radar policial. Além disso, os tais “curiosos” do caso sempre devem ser levados em consideração: outro vizinho de Laura, que várias e várias vezes apresentou informações conflitantes, também fora deixado de lado.


Quanto a Rafael Viturino, o primeiro suspeito do caso, a polícia só confrontou uma vez seus álibis. O chefe dele, de nome “Marcione”, nunca foi ouvido em depoimento. E foi com ele que Rafael viajou no dia seguinte ao rapto de Laura.


Eu desconheço, inclusive, pedidos de quebra de sigilo fiscal, telemático e telefônico dos principais suspeitos deste caso. Ao longo da investigação, pouco deste recurso foi utilizado.


Para Laura, economia e descaso foram as diretrizes.


Temos ainda a mãe de Laura, Sione Pereira, e também suspeita no rapto da criança. Sua possível participação no caso até hoje não foi esclarecida totalmente. Na verdade, depois de ela ter sido assassinada, ficou extremamente difícil esclarecer esse contexto.


Em conversas informais ao longo do trabalho de apuração desta reportagem, verifiquei que esta versão possa ser de fato a que aconteceu com Laura. Mas, não é bem assim.


Conversa com fontes que conhecem o submundo do narcotráfico em Palmas desconhecem totalmente essa possibilidade, de dívidas de drogas terem motivado esse rapto.


A outra versão que resta é o tráfico de crianças. Inclusive, o tal “carro escuro” rondando o Residencial Flores da Amazônia no dia do sumiço de Laura vai ao encontro dessa possibilidade nunca explorada e trabalhada devidamente pela polícia.


Interlocutores que fazem de conta


Observando de forma ampla, fica evidente que um descaso tão notório quanto este só seria possível com a conivência de outras instituições, e neste caso o próprio Ministério Público do Tocantins (MPTO).


Ao longo de sete anos, o órgão junto se limitou as manifestações de rotina no processo da investigação. De fato, pedidos de novas diligências, prazos para conclusão ou mesmo arquivamento foram solicitados. Mas uma vez posto o pedido, nada mais acontecia.


De um lado, a polícia ignorando os pedidos do MPTO e do outro os promotores, parecendo fingir que estava tudo bem. Foi assim com Saulo Vinhal e foi assim com João Edson, ambos com atuação em Palmas e com presença marcada no inquérito de Laura.


Até o juiz Luiz Zilmar, com ampla atuação em condenações por tráfico e outros crimes em Palmas, cobrou prazos sobre a investigação e foi ignorado. Em que universo pedidos assim podem ser desconsiderados pela polícia, sem nenhum tipo de prestação de contas ou argumentos. A culpa é de Laura?


Um caso em que até o Ministério da Justiça cobrou prioridades, fica difícil demais aceitar a forma como tudo aconteceu! E se é difícil para mim, que sou um jornalista que acompanha o caso, imagina para os familiares.


Acredito que Laura não esteja viva. Já se passaram sete anos do seu desaparecimento e não existe nada concreto sobre seu paradeiro. As linhas de investigação adotadas pela polícia não deram em nada. Não existe um único depoimento posterior ao dia em que ela sumiu e que forneça indícios de seu paradeiro.


Para Laura, somente nossas lembranças e nossas homenagens através desta reportagem.


Rafael Miranda Soares Silva - Dezembro de 2023

1 Comment


WELMA Matos
WELMA Matos
Jun 20

Acabei de ler, e é muito triste saber q até hoje a justiça não foi feita!!! E eu acredito q alguém viu sim, pois havia muitas pessoas na rua nas últimas imagens de Laura, alguém sabe e está em silêncio!!!

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(DHPP - Palmas) Governo do Estado do Tocantins

dhpp@ssp.to.gov.br


106 Norte Al 01 Lt 06,

Plano Diretor Norte - Palmas/TO

CEP: 77.006-068

Universidade Federal do Tocantins - UFT. Trabalho de Conclusão de Curso. Jornalismo - Julho/23

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